Os prefeitos que assumirão a administração de suas cidades a partir de 1º de janeiro de 2021 encontrão mais dificuldades que os seus antecessores. A economia brasileira estará em recuperação após a recessão mais aguda da história, provocada pela pandemia de covid-19. No rastro da crise, queda de arrecadação e aumento do desemprego. As despesas não deverão dar trégua, ainda sob ameaça de mais gastos por causa de novas infecções.
“Num primeiro momento, eles vão enfrentar um cenário de terra arrasada”, prevê Ricardo Macedo, professor do curso de Ciências Econômicas do Ibmec no Rio de Janeiro. “Quem assumir uma prefeitura, além de ter poucos recursos, tem que descobrir novas fontes de receita.” Em sua opinião, o poder público municipal tem que fiscalizar mais, renegociar dívidas, e recuperar receitas – “pra fazer o caixa fluir”.
Os novos administradores municipais começarão o mandato fazendo conta de menos. Conforme previsto em lei, os municípios, assim como estados e Distrito Federal, deixarão de receber o auxílio emergencial pago pela União após nove meses de pandemia. Até dezembro de 2020, esses entes federativos terão recebido R$ 79,19 bilhões do governo federal.
“O socorro da União aos municípios não tem como se repetir em 2021. É um ano de muito desafio na parte fiscal”, descreve José Ronaldo de Castro Souza Júnior, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “Os gestores municipais estão sem quase nenhuma disponibilidade de caixa para políticas públicas, investimentos e gastos que não sejam pagar salários”, descreve.
O consultor da área de estudos técnicos da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) Eduardo Straz também usa o termo “desafio” para falar da situação dos municípios no primeiro ano de mandato dos novos prefeitos. “A sociedade via cobrar fomento de emprego e renda e já vai votar pensando nisso”, alerta aos candidatos – lembrando que até o período de transição e de preparação da nova administração vai ser mais curto por causa do adiamento das eleições em mais de um mês entre outubro e novembro.
Mais desequilíbrios
A extinção do recurso da União, a presença do coronavírus e a eventual retomada lenta da economia poderão agravar a situação fiscal de muitos municípios, especialmente entre aqueles que sofrem com o desequilíbrio entre o que arrecada e o que gastam – sobretudo em despesas obrigatórias.
De acordo com o Índice Firjan de Gestão Fiscal, medido com dados de 2018 junto a 5.337 municípios (96% das cidades brasileiras), mais de um terço das prefeituras não gera receita suficiente para manutenção da própria estrutura administrativa. Um quinto das prefeituras terminou aquele ano sem caixa para quitar todas as despesas. Quase a metade das cidades (49,4%) gasta a maior parte da receita com pessoal (54%).
O estudo Multi Cidades – Finanças dos Municípios do Brasil, publicado pela Frente Nacional de Prefeitos (FNP), também com dados de 2018 referentes a 4.533 cidades (81,4% do total), esboça igualmente quadro de preocupações para os novos prefeitos: de cada R$ 10 que o conjunto das administrações municipais dispunha, R$ 9,09 foram gastos com despesas de pessoal (R$ 300,19 bilhões no total) ou custeio da máquina pública (R$ 247,14 bilhões). Apenas 6,4% (R$ 38,37 bilhões) de tudo que foi gasto se destinaram a investimentos.
Gastos sociais
Pessoal e custeio são as principais despesas para os municípios cumprirem suas obrigações estabelecidas em lei com educação (gastos de R$ 163,55 bilhões), com saúde (R$ 151,63 bilhões) e assistência social (R$ 17,98 bilhões). As três grandes rubricas consumiram juntas 55,3% (R$ 333,16 bilhões) de tudo que as cidades dispunham.
“Para manter escola pública, posto de saúde, Centro de Referência de Assistência Social (Cras), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e todos os serviços essenciais abertos, os municípios tiveram que contratar pessoas. O pagamento desse pessoal consome grande parte dos recursos que vem dessas transferências”, assinala Eduardo Straz, da CNM.
O Brasil tem 5.570 municípios, ou 5.568 cidades se desconsideramos que Brasília e Fernando de Noronha que não têm prefeitura. O número expressivo de localidades indica a possibilidade de diferenças na situação econômica e social. Segundo a FNP a receita por habitante média dos municípios foi de R$ 2.992,79 em 2018.
Os valores apurados mudam conforme a região. No Sul, a média foi de R 3.475,43, enquanto no Norte, foi de R$ 2.295,98. A receita disponível é diferente conforme o porte do município e a vocação econômica das cidades e a disponibilidade de recursos naturais.
De acordo com o estudo da Frente Nacional dos Prefeitos, “existe um reduzido número de municípios, cerca de 0,7% do total, que conta com elevadíssimas receitas per capita anuais, cujos valores superam R$ 10 mil por habitante. Na sua grande maioria, são aqueles beneficiados pelo recebimento de royalties e participações especiais do petróleo e gás natural, royalties da mineração ou compensações financeiras pela ocupação de parte de seus territórios pelas represas destinadas à geração de energia elétrica.”
Agência Brasil
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